Estado e setor privado segundo critérios éticos
Por Luís Barbosa Vicente
A iniciativa privada é sem dúvida um agente facilitador da empregabilidade e da criação de riqueza de uma nação. Contudo, é importante fomenta-la e incentiva-la segundo critérios éticos e sociais tendo em conta o perfil da sociedade onde se insere.
A iniciativa privada é sem dúvida um agente facilitador da empregabilidade e da criação de riqueza de uma nação. Contudo, é importante fomenta-la e incentiva-la segundo critérios éticos e sociais tendo em conta o perfil da sociedade onde se insere.
As nações
que enveredam para um processo de incremento e alavancagem das suas economias
sofrem pressões internas e externas que, às vezes, não se compadecem com as
lógicas que assentam em princípios éticos de gestão e da boa governação das
políticas em matéria de regulação e da defesa dos interesses públicos.
Na verdade,
os riscos associados à essas pressões resultam na forma como são encarados os
posicionamentos e participações na esfera privada e nos interesses subjacentes
aos serviços requisitados pela administração pública. É, por isso mesmo,
importante acautelar tais posicionamentos e lógicas de participação “dual” nos
investimentos que se pretendem imprimir.
Como é
lógico, o veículo do crescimento é o investimento e a primeira condição do
investimento é a confiança. No caso da Guiné-Bissau, dada a atual conjuntura, é
até concebível que o maior volume de investimento, face à dinâmica pública que
se avizinha, seja de iniciativa privada - nacional ou através de Investimento
direto estrangeiro - uma vez que a parcela do investimento público terá de ser
seletiva, reservada a uma análise custo-benefício e aos resultados esperados: à
medida que a situação orçamental ganhe performance, pode o investimento público
ser intensificado em áreas que apenas têm a ver com as funções do Estado.
Porém, o
facto de a Guiné-Bissau ser uma economia aberta e de mercado, muito exposto as
variáveis externas da dependência regional, em tempo de globalização acentuada
e de complexificação das engenharias jurídicas e financeiras, deve atribuir a
maior importância as funções de regulação, supervisão e fiscalização que,
asseguradas pelo poder político e público, são uma condição essencial da
garantia de funcionamento dos mercados e das entidades que nele interagem, bem
como da imparcialidade da administração e dos seus funcionários. Ou seja, a
garantia de confiança dos agentes públicos neste empreendimento e na forma como
devem ser observados os processos de interação com os privados é de tal forma
importante que implica uma redobrada atenção dos respetivos atores.
Assim, as
instituições do Estado, como ativos de regulação, devem garantir um serviço
público de qualidade e em perfeita sintonia com o princípio da eficiência que
impõe à administração pública e a seus agentes a persecução do interesse comum
por meio do exercício das suas competências de forma imparcial, neutral,
transparente, participativa e eficaz. Revalorizar um Estado imparcial perante
as empresas, intransigente quanto a atividades ilícitas, e transparente com os
seus serviços, constitui, desde logo, uma obrigação reformadora e condição
essencial para o reforço de confiança dos cidadãos nas instituições públicas.
Para
garantir este suporte e mecanismo de atuação é importante, também, obrigar às
empresas maior transparência no cumprimento dos seus deveres éticos e de
responsabilidade social. É igualmente importante separar as funções públicas
das funções privadas, ou seja, quem desempenha cargos públicos não pode
participar nem tomar decisões em matéria de interesse privado, por motivos de
conflito de interesses, quanto menos acumular funções públicas e privadas, uma
vez que não se compadecem com os critérios éticos tendo em conta a necessidade
de regulação do próprio sistema que se pretende perfeito, eficaz e sério.
Por outro
lado, as relações que, a todos os níveis, o setor empresarial mantém com o
Estado, devem subordinar-se sempre às regras de conduta e da boa disciplina,
através do cumprimento de todas as suas obrigações perante o Estado, repudiando
as eventuais práticas de corrupção dos agentes do Estado sempre que delas tomem
conhecimento e, ainda, responder atempadamente e com total transparência às
solicitações quando fundamentadas no interesse geral dos poderes públicos e
respetivos agentes reguladores e fiscalizadores.
Mais,
parece-me de todo importante ponderar a criação de um Código de Ética que tenha
por base a questão da responsabilidade social empresarial para com o Estado e
este para com as empresas, definindo os limites e os pressupostos em que a
relação deverá ocorrer sempre na lógica da separação dos poderes entre o
regulador e regulado.
A confiança
entre os atores públicos e privados, bem como a necessidade de uma regulação em
perfeita sintonia com a ética[1]
e responsabilidade social, deve consubstanciar-se numa garantia de relação
mútua subordinada aos reais interesses da nação. Talvez atuando na origem dos
problemas que caraterizam o setor público e sua relação com o privado, tendo em
conta a necessidade de parcerias responsáveis e sólidas, tornará possível
disciplinar eticamente o tecido produtivo que se pretende para o país.
Maio de
2015
(*) Consta do livro «Guiné‑Bissau, das contradições politicas aos desafios do futuro» de Luís Barbosa Vicente, Editado pela Chiado Editora (2016).
[1] Sugiro a leitura de MOZZICAFREDDO, Juan (2003), “A responsabilidade e
cidadania na Administração Pública”, in Juan Mozzicafreddo, João Salis Gomes e
João S. Batista (orgs.), Ética e administração: como modernizar os serviços
públicos, Oeiras, Celta Editora
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